ANDRÉA HADDAD
Redação/Secom-MT
A simplicidade da mulher de cabelo grisalho, mãos calejadas, baixa estatura, feição alegre e límpida que transparece a sabedoria dos 80 anos de idade contrasta com a fama internacional conquistada por servir um dos cafés da manhã mais deliciosos da Capital mato-grossense e, há quem diga, do mundo. “Todos os dias pergunto a Deus se mereço tudo isso”, confidencia Eulália da Silva Soares, a Dona Eulália do tradicional ‘tchá cô bolo’ cuiabano.
A fama foi propagada pelos clientes assíduos da ‘cuiabania’, estrangeiros e pelas matérias veiculadas em programas de televisão como Fantástico e Ana Maria Braga. Numa demonstração de humildade que pouco se vê em tempos de busca excessiva por exposição na mídia, dona Eulália mostra-se tímida ao ser requisitada para tirar fotos. Chega ao ponto de pensar que a Copa do Mundo não deve influenciar o movimento. “Não penso nisso, mas se aparecer mais gente, aumentamos a quantidade de queijo e arroz”. Mal sabe ela o que a espera. Representantes da Federação Internacional de Futebol (FIFA) já visitaram o espaço e tiraram uma série de fotos da estrutura do local, que deve ser incluído no roteiro oficial a ser entregue a turistas.
Os quitutes do ‘tchá cô bolo’ começam a ser preparados um dia antes. Pela tarde ela seca e tempera o arroz, além de ralar a mandioca para depois misturar o angu com fubá. Às 3h da madrugada começa a preparar a massa e colocar os ingredientes como manteiga, fermento, canela, entre outros, ao mesmo tempo em ferve a água dos chás, café e leite servidos gratuitamente. Por volta de 4h está tudo pronto. Os bolos de arroz e de queijo, chipas e demais atrativos já podem ser levados aos fogões de lenha. Às 5h30 Dona Eulália abre o portão para os primeiros clientes. Logo o ambiente está lotado.
Quem chega pela primeira vez se surpreende com a entrada estreita de acesso ao quintal das duas casas geminadas, de estilo simplório, situadas na rua professor João Félix, nº 470, no bairro Lixeira. “Tem gente que chega, geralmente com um amigo, e pergunta: ‘mas é aqui’?! Depois que come sai tirando fotos e vem perguntar se eu sou a famosa Dona Eulália”, brinca. Indagada sobre o segredo do bolo de arroz, ela para por segundos, pensa, abre um sorriso e responde: “Faço tudo com amor!” É com este sentimento, sem sombra de dúvidas, que ela vai receber no agradável espaço familiar turistas da Copa do Mundo.
Bolos de arroz e de queijo, chipas e demais atrativos são preparados com amor, diz dona Eulália
Diariamente, Dona Eulália acorda de madrugada, reza o terço e agradece pela união da família - tanto que foi pela fé que caiu na boca do povo. O bolinho de arroz virou o “quitute oficial” da tradicional Festa de São Benedito. Fora os quatro dias do evento, fieis costumavam sair da missa e passar no espaço dela para desfrutar o ‘tchá cô bolo’. Foram 13 anos trabalhando dia e noite para dar conta dos pedidos antes de abrir o portão de casa para os clientes. Nesta época as encomendas se multiplicaram e ela não dava mais conta da demanda. Crescidos, alguns dos 8 filhos começaram a ajudar a mãe. Depois vieram os 21 netos e 18 bisnetos. A maioria hoje trabalha com a matriarca.
Com o avanço da idade Dona Eulália passou para a filha Claudinete Soares de Oliveira a incumbência de gerenciar o estabelecimento. “E é só ela que pegou o jeito de fazer o bolo de arroz. Os outros conseguem preparar o resto dos quitutes, mas só a Claudinete sabe o principal”, diz. Nos finais de semana e feriados 12 pessoas da família ajudam. “Minha felicidade é saber que, se amanhã eu faltar, minha família vai continuar este trabalho e ter o sustento próprio”.
Tudo começou em 1956 quando Dona Eulália deixou o sítio na comunidade de Aricazinho, onde nasceu, para morar em Cuiabá com os dois filhos e o marido Eurico Avelino Soares, hoje com 94 anos. Ele trabalhava de pedreiro e, para ajudar em casa, em 1958, Dona Eulália começou a fazer os quitutes sem se basear em qualquer receita, apenas nas lembranças que tinha da tia cozinhando.
“Eu era muito observadora. Pena que ela morreu sem saber que os quitutes fariam sucesso”. Nesta época Dona Eulália pedia para ‘guris’ venderem os bolinhos na escola. “E assim foi indo. Ficava sabendo de festinha que tinha e participava. Depois, veio a Festa de São Benedito, começava no primeiro dia com 3 mil bolinhos e, no quarto, chegava a até 6 mil”.
Hoje Dona Eulália é mais que uma quituteira de mão cheia, mas uma personagem tradicional da cuiabania.
Mais informações sobre o ‘tchá cô bolo’ da Dona Eulália podem ser obtidas pelo telefone (65) 3624-5653, pelo e-mail eulaliaefamilia@hotmail.com ou no Facebook.
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