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10 de novembro de 2014

Artesãs de Mato Grosso conquistam mercado internacional


ANDRÉA HADDAD
Redação/Secom-MT
Imagine artesãs do interior de Mato Grosso expondo peças de cerâmica na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, nos EUA. O que parecia impossível transformou a vida da professora aposentada Lucileicka da Silva David, de Barra do Garças, e da ex-secretária Neulione Alves Gomes, da Aldeia Umutina, na Zona Rural de Barra do Bugres, ambas amantes do artesanato de cerâmica. Elas enviaram à ONU cinco fotos dos respectivos trabalhos e, com outras 13 artesãs do país, foram selecionadas por profissionais da entidade para participar da exposição “Mulher Artesã Brasileira”, na primeira quinzena de setembro do último ano. “Até as joias que usei foram requisitadas pelas mulheres que viam. Vendi mais de mil dólares!”, relata Neulione. 

Após o evento de cinco dias, a procura por peças chegou a triplicar e as duas artesãs mato-grossenses tiveram que rever a logística de produção para atender a demanda. Nesta quarta-feira (05.11), por exemplo, Lucileicka entregou duas mil peças na Casa do Artesão, onde funciona o Museu de Artesanato de Mato Grosso, na região central de Cuiabá. As peças são encomendadas a cada dois meses e revendidas no espaço. Toda a produção, antes transportada em um carro pequeno de Barra do Garças para a capital, passou desde a exposição na ONU a ser entregue em um veículo com carroceria acoplada. No interior, ela é procurada por clientes de Cuiabá, turistas de outros estados e estrangeiros encantados com a repercussão das peças expostas em Nova York.


Com o lucro de R$ 9 mil na comercialização dos produtos na Casa do Artesão, Lucileicka lança mão dos 15 anos de experiência e parte neste fim de semana para Chapada dos Guimarães, onde ministra cursos de artesanato em cerâmica, inclusive sobre a importância e de como usar forno específico para este tipo de produção. Em Barra do Garças, ela tem a ajuda de duas ex-alunas, Natalice Marcolan e Odília Garcia. “Se morresse amanhã, morreria realizada com a exposição da ONU. O melhor do artesanato brasileiro exposto no melhor lugar do mundo!”. Para ela, a atividade é excelente para a saúde mental e financeira. 


Lenine Martins /Secom-MT
Utilitários de artesanato em cerâmica à base de casca de pequi
Utilitários de artesanato em cerâmica à base de casca de pequi
O diferencial das peças da professora aposentada é a composição da argila, comprada em São Paulo, à base de caulim, feldspato e alumina, elementos que geram a consistência necessária para a queima em fornos elétricos ou a gás a temperatura de 1,280 mil graus Celsius. Os utensílios são vidrados de cinzas de cascas de pequi, baru, babaçu e bambu. Neste processo, a zinca se transforma num talco e, com isso, a artesã faz a tinta, pinta e leva ao forno. Ela também usa casca de arroz para deixar a peça fosca. 

Cada utensílio leva a história de determinada cultura indígena. “Na venda explico porque só a índia usa certos adornos, em contraste com os homens, dependendo da aldeia que abordo. Uso hieróglifos deixados pelos antepassados da minha região e ainda ganho uma boa renda para fazer o que gosto". 


Lucileicka e a ex-secretária Neulione foram motivadas pela coordenadora do Programa de Artesanato Mato-Grossense (PAB-MT) da Secretaria de Comércio de Minas e Energia (Sicme), Euvira da Costa Leite, que apostou nos trabalhos e sensibilizou-as a partir para o empreendedorismo com oportunidades de participar de feiras pelo Brasil afora. O ápice, como não poderia deixar de ser, foi a exposição na principal sede mundial da ONU. 


Exportação - Joias e adornos da artesã Neulione, por sua vez, estão espalhados pela Itália, França e EUA. São confeccionados a partir de sementes, coco, penas de galinha e ganso. Moradora da Aldeia Umutina, na Zona Rural de Barra do Bugres, ela conquistou o certificado para exportação depois da estadia em Nova York. “Até as joias que usei foram requisitadas pelas mulheres que viam. Vendi mais de mil dólares!”. Produtos comercializados a R$ 80 em Mato Grosso foram comprados pelas norte-americanas por U$ 180. Ela conta com peças tradicionais e outras em conformidade com a moda. De ex-secretária, passou a ministrar curso na Escola Técnica de Mato Grosso (IFMT) e nas aldeias. “É o resgate da cultura indígena. Ensinamos, por exemplo, aos netos de índios o artesanato que os avôs deles faziam”.


Casada com o índio Paulo Atodoneta, Neulione ensinou ele e demais familiares a fazer as peças de madeira. A pintura fica a cargo dela. “Isto não consegui ensinar nem para as mulheres, só eu faço”. Antes, ela participou de cursos da Sicme, em parceria com o Sebrae, para se qualificar. Desde então, ensina a técnica às demais integrantes de uma cooperativa familiar da aldeia. Todas são beneficiadas com a geração de renda proporcionada com a repercussão das joias expostas no evento do ONU.


Criada no interior, a artesã não sabia valorizar o próprio material, nem onde expor as peças. Conhecer os EUA então foi uma novidade. “Não tinha a mínima curiosidade, achava que meu país tinha tudo que precisava”. Ao desembargar na maior cidade cosmopolita do mundo, Neulione conta que passou a entender o significado do termo ‘primeiro mundo’. “Amei! Vi coisas que nunca imaginei, museus enormes, peças, filmes, foi um aprendizado. Se pudesse voltar, gostaria muito”.


Junto com a coordenadora do Programa da Sicme, a artesã está participando do 7º Salão do Artesanato, em Brasília. Em dezembro, expõe em Belo Horizonte (MG) e, depois, em São Paulo (SP), no Anhembi, considerado um dos melhores centros de eventos da América Latina. “Todas estas feiras foram oportunizadas pela Sicme. "O espaço é pago por eles, arcamos com estadia, transporte e alimentação”, explica Neulione. 


Na capital paulista, no fim do ano, ela vai cruzar novamente com a colega Lucileicka, que se prepara para expor em São Paulo 50 peças, com grafismos indígenas da região do Araguaia. É a consolidação da produção artesanal mato-grossense no Brasil e no mundo.  

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