“No Pantanal, passa boi, passa boiada, a natureza fica” (Augusto César Proença)
Estudos realizados nas regiões de maior foco de incêndios florestais na Costa Oeste dos Estados Unidos, como Califórnia e Oregon, comprovam aquilo que o homem pantaneiro aprendeu na convivência com o Pantanal e cujo conceito pesquisadores e organizações ambientais tentam desqualificar por desconhecimento ou interesse ideológico: o pastoreio do gado é ferramenta essencial para reduzir o fogo em áreas de concentração de biomassa.
Pesquisadores da Extensão Cooperativa da Universidade da Califórnia concluíram que a presença do gado contribui para eliminar material combustível nos campos, cuja técnica, sustentam, “deve ser expandida e aprimorada”. O pastoreio direcionado, concentrando o gado nas gramíneas para reduzir a quantidade de combustível herbáceo fino disponível para queima, é resultado de estudos realizados também pela Universidade do Estado de Idaho.
Estratégia simples e eficaz
O Rangeland Center da Faculdade de Recursos Naturais está conduzindo estudos de pastoreio direcionado em pastagens na área de Reynolds Creek, no condado de Owyhee (Idaho), enquanto na Califórnia o governo decidiu criar uma estratégia simples e de baixa tecnologia, “mas inquestionavelmente eficaz”, ante o volume de recursos (bilhões de dólares) consumidos anualmente para combater os incêndios: expandir o uso de pastagem por gado, ovelhas e cabras.
“O pastejo é um dos métodos de gerenciamento de combustível que realmente atingem o objetivo de remover o material em combustão de nossas paisagens”, afirma o governador californiano Gavin Newsom. Ele criou um fundo financeiro para estimular os fazendeiros ao uso dessa ferramenta econômica para o manejo da vegetação e que pode ser empregada em áreas onde outras medidas não são possíveis, informou o site “The Sacramento Bee”.
O resultado de pesquisas e a tomada de decisões governamentais nos estados norte-americanos para conter a devastação ambiental e econômica causada pelos incêndios florestais reforçam a tese do “boi bombeiro”, sustenta o presidente do Sindicato Rural de Corumbá, município com 1,9 milhão de cabeças de gado, Luciano Leite. “A comprovação científica fora do Brasil contrapõe a tentativa de lacração da função ecológica do boi”, disse.
Bovinos protegem Pantanal
Experimentos realizados pela Embrapa Pantanal, coordenados pelo ex-pesquisador da instituição Arnildo Pott, criador do termo “boi bombeiro”, são irrefutáveis: os bovinos ajudariam a combater o fogo se fossem deslocados para áreas onde a pecuária tem baixa atratividade e, por isso, acumula matéria seca e inflamável. “O que o boi não come, o fogo come”, diz Pott, para quem o conceito do “boi bombeiro” está sendo distorcido.
Estudo recente dos pesquisadores Urbano Gomes Abreu, da Embrapa Pantanal, e Luiz Orcírio Fialho de Oliveira, da Embrapa Gado de Corte, ainda não publicado, amplia o conhecimento sobre o tema em “por que os bovinos protegem o Pantanal de incêndios”. Eles reafirmam que a presença do gado mantido de forma sustentável é muito importante para a redução do volume de massa vegetal no ambiente pantaneiro, visto sua dieta diversificada.
Os autores também apresentam evidências da relação entre o aumento da incidência de focos de calor associadas não apenas às questões climáticas severas, mas à redução do rebanho em Corumbá, município com 45% de seu território (65 mil km²) dentro do Pantanal. “Percebe-se que a redução do rebanho local, da ordem de 150 mil animais, pode levar a um acúmulo de mais de 1 milhão de toneladas de matéria seca, potencialmente incendiável”, apontam.
Ocupar áreas improdutivas
Para garantir maior controle dos incêndios, o Sindicato Rural de Corumbá cobra do governo uma política de incentivos para a repovoamento da extensa área do Pantanal não ocupada pela pecuária, representando um grande vazio sem a presença do boi e do homem. Também propõe arrendamento do pasto das unidades de conservação para a produção bovina, como já ocorre em alguns países, haja visto que os incêndios foram mais intensos nas reservas legais.
“Retirar o gado das RPPNs (Reserva Particular do Patrimônio Natural) criadas no Pantanal é um grande equívoco, resultando em grande incidência de queimadas devido a concentração de material combustível, como ocorreu no Sesc Pantanal, Parque Nacional e nas regiões do Rio Negro e da Serra do Amolar”, afirma o presidente da entidade, Luciano Leite. “Está comprovado, o gado cumpre sua função de pastoreio, caso contrário tudo vai virar incêndio.”
A posição do sindicato é respaldada pelo pesquisador Evaristo de Miranda, chefe da Embrapa Territorial, segundo o qual o declínio da pecuária e a criação de reservas tem sido determinantes no aumento dos focos de calor no bioma. “Quando se retira o gado, como se retirou das RPPNs, a perda de áreas de apascentamento causa prejuízos econômicos e ambientais, o capim cresce e na hora que o fogo pega é um fogo muito intenso, incontrolável”, sustenta.
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